Palco

Violet
3 min readMar 25, 2021

Ótimo, você está aqui. Esperei um tempo até você aparecer, sabia?
Não, não olha pra esquerda. O cara da esquerda é um babaca. O da direita também. Por favor, não se vire para trás. Você não quer saber o que tem ali.

O cara da esquerda? Ah, sou eu. O da direita também. O que tem atrás de você? Acho que você já entendeu a mensagem.

Isso. Olhe pra mim, aqui, na sua frente.

Tudo bom?

Bom, vamos começar. Fico muito feliz por você poder comparecer ao nosso — meu — show! Me esforcei muito pra montar esse palco, e você vai ser o primeiro a poder ver nosso ato, nosso tão amado e dedicado número artístico! Confesso que estive um pouco ansioso, sabe? Pensei que você não iria aparecer. Afinal, eu te conheço muito bem.

Porque eu sou você.

Então! Que iniciemos a obra?

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Eu entro no quarto e sento na cadeira, uma máquina de escrever descansa na minha frente, quieta em cima da mesa, aguardando meus dedos irrequietos que iniciarão esta narrativa. Mas esta narrativa já se iniciou, a máquina de escrever não é mais necessária. Com um suspiro exasperado, o objeto some sem deixar nenhum traço de que estava ali. Poxa, desculpa.

O resto do quarto? Não há nada. Ou melhor — não interessa o resto do quarto. É só uma cadeira, uma mesa, e eu.

Uma cadeira, uma mesa e eu. Uma cadeira, uma mesa, e eu. Uma cadeira. Uma mesa. E eu.

E eu.

E eu.

Não dá pra trabalhar assim. Por favor, traz a máquina de escrever de volta?

A máquina de escrever retorna à existência narrativa com um suave pop, balançando um pouco ao encostar na mesa. Obviamente, está nervosa por trabalhar horas extras e não receber por isso. Vou ter que conversar com a máquina de escrever mais tarde.

Eu começo a digitar. É complicado escrever quanto estou nervoso. Na verdade é complicado pensar, escrever até que vai. De qualquer forma, escrevo. O problema é, quando estou nervoso, tem muito barulho aqui. E quanto mais barulho, menos eu consigo me concentrar, e quanto menos eu consigo me concentrar, mais nervoso eu fico e quanto mais nervoso eu fico — já deu pra entender.

Tem que ser muito burro pra escrever isso. É basicamente parnasianismo pós-moderno e isso me dá nojo.

Licença, estou tentando trabalhar.

Dá pra ver. Bem fácil chamar de “trabalho” escrever teu fluxo de consciência em uma página em branco. Até eu estou fazendo isso agora. Nossa. É mais difícil do que eu pensava. Eu errei, me perdoe. Acho que vou morrer de exaustão.

Se você tivesse um foco talvez eu conseguisse trabalhar melhor, porque você calaria a boca. E você precisa melhorar sua ironia. Péssimo. Pobre, até.

Disse o cara que escreve sobre escrever. Como tá aí no século XIX?

Morra.

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Chega. Infelizmente não acho que estamos preparados o suficiente para uma performance de qualidade. Eu não consigo acreditar que até mesmo depois de anos ensaiando seríamos capazes de continuar cometendo os mesmos erros. E olha que aparentemente deveríamos aprender depois da terceira vez, como diz algum ditado por aí. Terceira vez é a da sorte? Ou três é demais?

De qualquer modo, precisamos encerrar nossa já curta apresentação. O fim é importante em todas as coisas. Pessoalmente, acredito que o conceito de “fim” é uma das coisas mais belas do nosso mundo, principalmente pelo fato de que você nunca sabe quando pode cheg

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Violet

O meu nome é Luiz e eu curso Letras-Português na UFSC. Eu gosto muito de videogames, coisas que brilham, livros de fantasia e dormir depois do meio dia.